«O debate sobre o Cartão do Utente de Saúde tem décadas», mas o projecto ainda não arrancou devido a «factores críticos ao nível da governação e da máquina administrativa» que tem de promovê-lo. As críticas ao IGIF apontadas pela gestora do Programa Saúde XXI no encerramento da apresentação das conclusões do Think Tank sobre o Cartão do Utente de Saúde podem ajudar a explicar porque é que foram levantadas várias questões sobre a tipologia, estratégia e sistema de financiamento que deverão estar na base deste cartão, que ficaram sem resposta.
Paralelamente à Jornada e-Medicina 2004, realizou-se no dia 29 de Junho, nas instalações do Infarmed, um Think Tank intitulado Repensar o Cartão do Utente de Saúde no contexto da e-Saúde.
As conclusões deste Think Tank foram apresentadas por Joan Ramon Marsal, da Gesaworld e Pedro Cerqueira, da PT Medicina, num dos mais esperados paineis da jornada, presidido por Carmen Pignatelli, gestora do Programa Saúde XXI .
O debate de ideias sobre o Cartão de Saúde assentou em três pressupostos: definir a estratégia e factores críticos na implementação do Cartão; definir que tipo de serviços se quer neste Cartão e estudar possibilidades de financiamento para o mesmo.
Relativamente à melhor estratégia, concluiu-se que é necessário:
– definir os objectivos do Cartão de Saúde;
– definir a rede de Saúde operacionalmente mais adequada;
– ajustar a oferta à procura.
Entre outros aspectos, o Grupo de Trabalho considerou que o Cartão de Saúde deve ser polivalente no acesso aos vários cuidados de saúde; deve ser distinto de outros cartões de relacionamento com a Administração Pública e não deve incluir serviços que não estejam directamente relacionados com a Saúde. Este cartão «deve garantir que o cidadão recebe pelo acto e não pela capitação» e permitir o melhor ratio eficiência/custo, transmitiu Marsal à plateia.
Sobre o segundo pressuposto, a task force constituída por 21 especialistas de entidades públicas e privadas do sector considerou que o Cartão do Utente de Saúde deve:
– permitir o acompanhamento permanente da situação do cidadão no seu relacionamento com os serviços de saúde;
– melhorar a eficiência do sistema;
– garantir interoperabilidade entre sistemas alternativos;
– permitir que os dados clínicos do utente sejam utilizáveis em off-line ;
– incluir informação primária (identificação do utente) e informação clínica básica (alergias, por exemplo), prevendo a evolução para uma informação mais completa;
– não incluir dados clínicos importantes/confidenciais, os quais devem constar em Bases de Dados centrais.
Este instrumento deve ainda garantir a facilidade de acerto de contas entre pacientes, seguradoras e prestadores de serviço; garantir a gestão dos custos/benefícios e permitir o acesso a Bases de Dados.
Finalmente, a equipa reunida neste Think Tank avaliou três possibilidades de financiamento:
– financiamento misto (público/privado)
– financiamento público (com sistema de reembolsos)
– financiamento privado (através de ganhos no sistema e reembolso privado)
Mas destas, nenhuma foi referenciada pelos responsáveis pela apresentação das conclusões do debate como sendo a melhor opção de financiamento para o tão aguardado Cartão do Utente de Saúde.
Ficaram assim levantadas várias questões sobre a tipologia, estratégia e sistema de financiamento que deverão estar na base da criação do melhor cartão a adoptar pelo Ministério da Saúde (MS), mas para as quais a assistência presente não obteve respostas. Como comentou Carmen Pignatelli, «o debate sobre o Cartão do Utente de Saúde tem décadas. Porque não se viabilizou, então, ainda este serviço?».
Para a gestora do Programa Saúde XXI, «o problema não está no financiamento». Os factores críticos que se têm verificado nos últimos quinze anos «situam-se ao nível da governação e da máquina administrativa que tem de promover o projecto», através do organismo competente: actualmente o IGIF Instituto de Gestão Informática e Financeira, sob orientação da tutela do MS .
Pignatelli recordou que «este não é um projecto para uma legislatura», concluindo que «o Cartão do Utente da Saúde só irá para a frente quando existir vontade política e quando, nos termos da lei, o organismo competente o assumir».
Segundo fonte da organização da Jornada e-Medicina, o IGIF foi convidado a participar neste debate, não tendo disponibilizado nenhum representante para o efeito.
Gabriela Costa
2004-07-01
http://www.e-medicina2004.org
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Em Foco – Opinião