Mudou apenas o cenário. José Pacheco Pereira, José Magalhães e António Lobo Xavier não destoaram do estilo tertuliano a que nos habituaram nas manhãs de domingo na antena da TSF. O tema em agenda foi o relançamento económico e sistemas de informação. Mas podia ser outro qualquer. Num debate onde até se falou de tanques e mísseis, os três deputados conseguiram arrancar monumentais gargalhadas de uma sala com 200 congressistas. Mais uma vez Pacheco Pereira e José Magalhães digladiaram sobre a necessidade de mais ou menos Estado. A moderação esteve, como habitual, a cargo de Carlos Andrade.
Em relação ao papel na área das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), António Lobo Xavier refere que o Estado tem uma tripla missão: a democratização do acesso à informação, integrar os avanços tecnológicos na Administração Pública e criação de uma ambiente competitivo saudável. Em relação a este ponto, Lobo Xavier, numa alusão à intervenção do ministro da Economia na sessão da manhã, enfatizou que o Estado tem falhado neste ponto e que um enquadramento legislativo não resolve só por si o problema.
O deputado do PS, José Magalhães, defendeu a ideia de uma intervenção forte do Estado na modernização das TIC, dizendo que, apesar dos constrangimentos europeus, é necessário que o Governo parta a máquina existente, dotando-a de novas funcionalidades, nomeadamente tecnológicas.
E porque o tema proposto para debate girava em torno das TIC, Pacheco Pereira, em videoconferência a partir de Estrasburgo, criticou duramente as iniciativas para a sociedade da informação saídas da Cimeira de Lisboa . A Europa não está, nem de perto nem de longe a cumprir a meta a que se propôs, que, como todos se recordam, era ultrapassar os EUA. A Cimeira de Lisboa está eivada de contradições. O benchmarking actual mostra que este desígnio está longe de ser atingido e que Portugal, apresar de alguns progressos, caiu vários lugares no ranking europeu.
Pacheco Pereira reiterou as críticas ao modelo social europeu, sublinhando que o atraso da Europa face aos EUA se prende com proteccionismos, como a excepção cultural francesa, que bloqueiam o avanço tecnológico europeu.
José Magalhães, tendo em conta fragilidades inerentes a Portugal, como o facto de 90 por cento dos acessos à internet serem efectuados em banda estreita, da utilização comerciai da internet ser inferior ao uso abstracto, e de 95 por cento do tecido empresarial português ser composto por PMEs, não deixou tecer críticas ao actual governo em relação à (não) transposição de directivas europeias relativas à privacidade, segurança digital, comércio electrónico e atrasos na TV Terrestre Digital e UMTS.
Lobo Xavier acrescentou ainda que Portugal padece também do facto de as questões relacionadas com o digital e com as telecomunicações serem tuteladas por dois organismos diferentes.
Pacheco Pereira, referindo-se à iniciativa socialista de ligar todos os estabelecimentos do ensino básico e secundário à internet, lembrou que em Portugal existem muitas escolas do ensino básico que não têm instalações telefónicas nem professores qualificados para lidarem com as TIC.
Colocar internet nas escolas não resolve o problema. O problema do PS sempre esteve na obsessão com as estatísticas. É preferível que as escolas fomentem o grau de literacia e estimulem as capacidades de investigação e criatividade dos estudantes. É necessário lembrar que muitos alunos não sabem sequer utilizar um motor de busca.
José Magalhães respondeu com aquilo que diz ser uma indefinição quanto ao modelo de financiamento da iniciativa da banda larga, tendo em conta que a iniciativa da Rede Ciência, Técnica e Sociedade (RCTS) do anterior governo foi concluída em tempo record.
Prefiro a opção levada a cabo pela UMIC que aposta na adopção da banda larga numa base de concursos públicos. A RCTS do governo socialista foi tudo menos uma rede. Consumiu 30 milhões de contos em três anos, foi realizada com o recurso a um único operador e sem qualquer concurso público. O que o governo do PS fez foi vender contratos de conectividade, retorquiu Lobo Xavier.
O deputado do PS, referindo-se inevitavelmente à política de cortes orçamentais do actual Governo, criticou o fim das deduções especiais em impostos na aquisição de material informático ou o pagamento aos municípios dos direitos de passagem das infra-estruturas dos operadores móveis que podem repercutir esses custos na factura dos clientes.
Pacheco Pereira rematou o debate dizendo que Portugal padece de problemas estruturais que se manifestam na forma como o Estado lida com a questão das TIC. Portugal continua a ter uma sociedade civil iletrada, frágil, habituada a ser comandada pelo Estado. Por outro lado o Estado não consegue implementar as tecnologias que anda a pregar pelo factor de encontrar resistências internas que querem que tudo fique na mesma.
Filipe Samora
2003-11-18
Centro de Informação-ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA